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domingo, 12 de fevereiro de 2023

Aqueles Dezessete Segundos...



Ficou surpreso quando percebeu-se ainda irresponsavelmente sonhador…

Pensava já ter perdido em algum canto da memória ambas as capacidades; a de sonhar e a de se surpreender.

Talvez lhe devessem jubilar na vida, pois há lições que ele obstinava-se a não aprender e apreender, ainda que lhe fossem dura e constantemente ministradas, vez após vez.

Vai saber o que move a fé de um homem sem fé em si mesmo…

Os dias escorrem monótonos por semanas que se arrastam lentas, dentro de meses congelados nos anos inertes…

Dezessete segundos…

Um estremecimento dos sentidos, uma fragilidade diante da própria fome de tudo, e lá está ele a espera de um momento de êxtase, um orgasmo físico ou moral qualquer que lhe fulminasse e deste modo pudesse descer o pano da sua vida em um instante de arrebatamento sensorial.

Entre os nacos do quinhão do amargo tédio nosso de cada dia, ele conta momentos, passando o tempo no esforço de passar o tempo, a espera do intervalo da vida, naqueles segundos.

...

A dança caleidoscópica dos corpos havia terminado e cada qual, lado a lado, experimentava absorto a sensação de paz perfeita decorrente do cessar dos gritos famintos dos hormônios. 

Um silêncio dos sentidos que durava sempre, exatos dezessete segundos.

Dezessete segundos de paz inebriada.

Ele deixa a mão escorregar para o chão, os dedos a tocarem de leve no piso frio, e a mente vagar, na batida do coração na ponta dos dedos, uma fantasia delicada de que não é seu corpo, mas o planeta que pulsa e vibra suave, enquanto ele luta para não escorregar para um sono gentil.

Um sono do qual ansiava intimamente, não precisasse mais despertar.

“Se eu dormir agora, corro o sério risco de acordar e ver nos olhos dela a decepção e a certeza de que me tornei um clichê.”

Ele não queria parecer insensível e pensava sim que era coisa absolutamente linda e desejável ficarem abraçados no escuro. Que modo há de encarar o escuro, senão o de estar entrelaçado no amor do outro?

Ainda assim, esperava que ela lhe desse aquele momento.

Aquela pausa de si mesmo e de seus medos futuros de solidão pretérita.

Se ele pudesse, escorregaria para dentro daquele instante que havia entre o tic e o tac do relógio, o momento do tempo real, pois cada parada do ponteiro, era um momento que já se foi.

Cada momento lembrado é um momento morto para além do tempo.

Menos ali, naquelas batidas cada vez mais lentas do coração na ponta dos dedos, não mais o seu coração, mas o coração do mundo.

Se ao menos pudesse...Ele se perderia voluntariamente ali.

Existiria dentro um instante que fosse eterno, não como coisa que passou.

Pois todo o tempo que se tem é sempre o tempo que já passou.

Menos aqueles dezessete segundos.




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